terça-feira, 12 de abril de 2011

Clarice Lispector


De origem judaica, terceira filha de Pinkouss e de Mania Lispector. Sua família sofreu a perseguição aos judeus, durante a Guerra Civil Russa de 1918-1921. Nasceu em Chechelnyk, 10 de dezembro de 1920, enquanto sua família percorria várias aldeias da Ucrânia, antes da viagem de imigração ao continent americano. Chegou no Brasil quando tinha dois meses de idade. A família chegou a Maceió em março de 1922, sendo recebida por Zaina, irmã de Mania, e seu marido e primo José Rabin.
Clarice Lispector começou a escrever logo que aprendeu a ler, na cidade do Recife, onde passou parte da infância. Falava vários idiomas, entre eles o francês e inglês
Em 1967, em seu apartamento do Leme, no Rio, na madrugada de 14 de setembro, adormece fumando e, ao perceber o incêndio que isso provocara, tenta apagar o fogo com as mãos. Fere-se gravemente. Sua mão direita, a da escrita, fica muito prejudicada.
Em 22 de junho de 1968, participa, com inúmeros intelectuais, de uma manifestação contra a ditadura militar: a Passeata dos Cem Mil.
Foi hospitalizada pouco tempo depois da publicação do romance A Hora da Estrela com câncer inoperável no ovário, diagnóstico desconhecido por ela. Faleceu no dia 9 de dezembro de 1977, um dia antes de seu 57° aniversário. Foi enterrada no Cemitério Israelita do Caju, no Rio de Janeiro, em 11 de dezembro
 
Romance
Conto
Crônica
 
 Entrevistas
 
Literatura infantil
 
 
 
 
Obras póstumas
 
nColetâneas de contos, crônicas ou entrevistas organizadas e publicadas postumamente:
nA Bela e a Fera (1979) – reunião de contos inéditos escritos em épocas diferentes
nA Descoberta do Mundo (1984) – seleção de crônicas publicadas em jornal entre agosto de 1967 e dezembrode 1973
nComo Nasceram as Estrelas (1987) – contos infantis
nCartas Perto do Coração (2001) – cartas trocadas com Fernando Sabino
nAprendendo a Viver (2004) – seleção de crônicas publicadas em jornal entre agosto de 1967 e dezembro de1973
 
Felicidade clandestina
 
 
nNesta coletânea de 25 textos reúnem-se alguns contos e crônicas publicados nos livros A legião estrangeira, Para não esquecer e A descoberta do mundo. Temas caros ao universo clariceano estão presentes neste livro: a relação mágica com os animais, a descoberta do outro, as inúmeras possibilidades de se escrever uma história, a presença do inesperado no cotidiano previsível. Naqueles textos de cunho autobiográfico é possível flagrar, por exemplo, momentos da infância marcados pelos sentimentos mais diversos; da euforia das descobertas ao choque das frustrações, como em Restos do carnaval ou em Cem anos de perdão.

O mistério do coelho pensante
 
 
nÉ a história do coelho Joãozinho que fareja idéias com o nariz e adora fugir de sua casinhola todas as vezes que não há comida. A autora cria um suspense ao não revelar como um coelho tão gordo consegue fugir daquelas grades tão estreitas.
 
n
Estudo da obra A hora da estrela
 
 
O Enredo
 
Antes de iniciar este tópico, é preciso que saibamos que as obras de Clarice dificilmente têm um enredo, um começo, meio e fim, como os cânones narrativos tradicionais. A própria autora nunca soube explicar os seus processos de criação. “É um mistério”, dizia ela. “Quando penso numa história, eu só tenho uma vaga visão do conjunto, mas isso é coisa de momento, que depois se perde. Se houvesse premeditação, eu me desinteressaria pelo trabalho.” (CAMPADELLI & ABDALLA JR.). Mais do que histórias, os seus livros contêm impressões. Por isso, consciente de sua condição como (não-)escritora, Clarice dizia-se uma “sentidora, intuitiva”.
A Hora da Estrela foi o último livro da autora publicado em vida. O narrador do romance é Rodrigo S. M., escritor que ironiza, através de várias contínuas no texto, o estilo de narrativa que ele próprio utiliza. Dessa forma, ele se coloca como uma das personagens centrais do romance, já que dialoga o tempo todo com o leitor sobre o estilo de sua narrativa. Sua personagem-protagonista é Macabéa (Maca), alusão
 
irônica aos sete macabeus, personagens bíblicos. Após a morte de seus pais, quando tinha dois anos de idade, Maca fora criada por uma tia beata, a qual nela muito batia. “Acumula em seu corpo franzino, ‘herança do sertão’, todas as formas de repressão cultural, o que a deixa alheada de si e da sociedade. Dessa forma, segundo o narrador, ela nunca se deu ‘conta de que vivia numa sociedade técnica onde ela era um parafuso dispensável’”. (idem) De Alagoas, a protagonista muda-se para o Rio de Janeiro, onde passa a viver com mais quatro colegas de quarto (todas Marias) na rua do Acre. Trabalhava como datilógrafa, profissão da qual tinha muito orgulho. Era virgem, e nunca, até Olímpico de Jesus, possuíra um namorado. Este, também nordestino, procurava a ascensão social, assim como ela tinha o sonho de ser uma “estrela de cinema” (daí o título do livro). Por não terem a ambição em comum, Macabéa perde-o para sua amiga de trabalho (e única), Glória, a qual possuía os atrativos materiais que ele sonhava.
A busca de identidade da personagem-protagonista processa-se quando ela se observa diante do espelho. A primeira imagem que vê é a do autor, Rodrigo S. M., majestático e presente em todo o texto, moldando a personagem à sua imagem e solidão. Há, também, outras vezes em que Maca se olha no espelho. Em uma delas, assim que rompera com Olímpico, ela, diante do espelho, passa em seus lábios um batom vermelho como busca da identidade desejada: Marilyn Monroe, símbolo social e sexual inculcado pelas superproduções de Hollywood da década de 50. 
Por conselho de Glória, Macabéa vai procurar ajuda em uma cartomante, sendo esta a única vez em que se dera conta da vida medíocre que levava; fora preciso Madame Carlota dizer isso a ela. Reforçando a idéia de “nostalgia do futuro”, a vidente prevê que a vida da nordestina mudaria a partir do momento em que saísse de sua casa. Esta também foi a primeira vez em que Macabéa encorajou-se para ter esperança. Um homem estrangeiro, alourado, “de olhos azuis, ou verdes, ou castanhos, ou pretos” (p. 77) apareceria em sua vida, casar-se-ia com ela. Ironicamente, a protagonista sai da casa de Madame Carlota e é atropelada por um Mercedes Benz. Consolida-se a “hora da estrela” de cinema, quando ela vai ser “tão grande como um cavalo morto”: ferida, a personagem vomita uma “estrela de mil pontas”. Com ela, morre também o narrador, identificado com a escrita do romance, que neste instante se acaba.
 
Foco Narrativo
 
Dizer se o foco narrativo de A Hora da Estrela é em primeira ou terceira pessoa é uma questão não tão simples de ser respondida, já que é um dos pontos mais inovadores e estilisticamente extraordinários do livro. A autora inventa um narrador (que, portanto, é também uma personagem e se assume durante a narrativa como tal) para contar a história de Macabéa. Assim sendo, o narrador, apesar de fazer parte da história, não conta uma trama que acontecera com ele, e sim, com a sua personagem inventada, que poderia ser real. A narrativa desvenda a sua problemática interior e à medida que nos faz conhecer a protagonista, também nos mostra (e vai descobrindo) a sua própria identidade.
O enredo de A hora da Estrela não segue uma ordem linear: há flashbacks iluminando o passado, há idas e vindas do passado para o presente e vice-versa.
Além da alinearidade, há pelo menos três histórias encaixadas que se revezam diante dos nossos olhos de leitor:

1.  A metanarrativa - Esta é a narrativa central da obra: o escritor Rodrigo S.M. conta a história de Macabéa, uma nordestina que ele viu, de relance, na rua.
 
n2.  A identificação da história do narrador com a da personagem - Rodrigo S.M. conta a história dele mesmo: esta narrativa dá-se sob a forma do encaixe, paralela à história de Macabéa. Está presente por toda a narrativa sob a forma de comentários e desvendamentos do narrador que se mostra, se oculta e se exibe diante dos nossos olhos. Se por um lado, ele vê a jovem como alguém que merece amor, piedade e até um pouco de raiva, por sua patética alienação, por outro lado, ele estabelece com ela um vínculo mais profundo, que é o da comum condição humana. Esta identidade, que ultrapassa as questões de classe, de gênero e de consciência de mundo, é um elemento de grande significação no romance, Rodrigo e Macabéa se confundem.

3.  A vida de Macabéa - O narrador conta como tece a narrativa.

Narrador e protagonista, inseridos em uma escrita descontínua e imprevisível, permitem ao leitor a reflexão sobre uma época de transição, de incoerência, como um movimento em busca de uma nova estruturação da obra literária similar à insegurança, à ansiedade e ao sofrimento. O tema é oferecido, socializando a possibilidade de ruptura.
O narrador revela seu amor pela personagem principal e sofre com a sua desumanização, mas, também, com a própria tendência em tornar-se insensível.
O foco narrativo escolhido é a primeira pessoa. O narrador lança mão, como recurso, das digressões, o que, aspectualmente parece dar à narrativa uma característica alinear. Não se engane: ele foge para o passado a fim de buscar informações.
para morar, rua do Lavradio para trabalhar. Com a raridade de um galo ‘cocoricando’ de manhã e o cais do porto para espiar, no Domingo, um ou outro prolongado apito de navio cargueiro.” Assim, pode-se perceber os contrastes (não apenas sociais) existentes em metrópoles brasileiras e o desalento de um imigrante nordestino que busca uma vida melhor no sul também pela ambientação da narrativa.
As Personagens
Com um falso livre-arbítrio, o narrador da narrativa decide que serão “uns sete (...) e eu sou um dos mais importantes deles, é claro.” (p. 13)
nMacabéa: nordestina (alagoana) que migra para o Rio de Janeiro, é a protagonista da narrativa. Datilógrafa, “toda fome e deserto”, Macabéa (Maca, como o narrador passa a chamá-la no decorrer da história) tem o heroísmo dos seus irmãos bíblicos, os sete macabeus. Seu nome é grafado quase como escreve-se “maçã”, símbolo da tentação, só que, como não poderia deixar de ser, sem os adornos da palavra indicadora da fruta. A personagem principal do livro mal tem consciência de existir, mas tem um desejo: tornar-se estrela de cinema, e admira com certa dose de melancolia Marylin Monroe e Greta Garbo. No fim da trama, de certa forma, acaba conseguindo realizar o seu sonho: a hora da estrela condiz com o momento de sua morte. Dialogando intertextualmente com Os Sertões de Euclides da Cunha, a autora (ou o narrador?) chega a comentar que “o sertanejo é antes de tudo um paciente”(p. 79)
nOlímpico de Jesus: imigrante nordestino assim como Macabéa, Olímpico trabalhava como operário numa metalúrgica e dizia-se “metalúrgico”. Possuidor de um dente de ouro, o qual muito estimava por ser demonstrador de poder, sonhava em um dia ser deputado, mas seu desejo secreto era ser toureiro. Procurava ascensão social a qualquer preço, seja do roubo ou do crime de morte. “Para mim a melhor herança é mesmo muito dinheiro. Mas um dia vou ser muito rico, disse ele que tinha uma grandeza demoníaca: sua força sangrava.” Torna-se o namorado da protagonista no decorrer da trama.
nGlória: amiga de trabalho (e a única) de Macabéa, possuía todo o charme e “carnes” que a outra não tinha. “Carioca da gema” (razão forte pela qual Olímpico atrai-se por ela), rouba o namorado da amiga. Na página 59 do livro há uma ótima descrição desta personagem: “Glória possuía no sangue um bom vinho português e também era amaneirada no bamboleio do caminhar por causa do sangue africano escondido. Apesar de branca, tinha em si a força da mulatice. Oxigenava em amarelo-ovo os cabelos crespos cujas raízes estavam sempre pretas. Mas mesmo oxigenada ela era loura, o que significava um degrau a mais para Olímpico. (...) apesar de feia, Glória era bem alimentada. E isso fazia dela material de boa qualidade.”
“Glória roliça, branca e morna. Tinha um cheiro esquisito. Porque não se lavava muito, com certeza. Oxigenava os pêlos das pernas cabeludas e das axilas que não raspava. Olímpico: será que ela é loura embaixo também?” (p. 63)
nSeu Raimundo Silveira: chefe da firma de representante de roldanas, é o responsável pela demissão de Macabéa, pois ela errava demais na datilografia, além de sujar invariavelmente o papel.
nA tia: beata que cria Maca após a morte da mãe menina, quando tinha dois anos de idade. “Muito depois fora com a tia beata, única parenta sua no mundo. Uma outra vez se lembrava de coisa esquecida. Por exemplo a tia lhe dando cascudos no alto da cabeça porque o cocoruto de uma cabeça deveria ser, imaginava a tia, um ponto vital. (...) Batia mas não era somente porque ao bater gozava de grande prazer sensual — a tia não se casara por nojo — é que também considerava de dever seu evitar que a menina viesse um dia a ser uma dessas moças que em Maceió ficavam nas ruas de cigarro aceso esperando homem.” (p. 28)
nAs quatro Marias: Maria da Penha, Maria Aparecida, Maria José e Maria apenas eram as colegas de quarto da nordestina. Uma delas trabalhava vendendo produtos de beleza Coty.
nMadama Carlota: a cartomante que prevê o futuro reluzente de Maca. Trata-a com um carinho que ninguém jamais dirigiu à protagonista. “Era enxundiosa, pintava a boquinha rechonchuda com vermelho vivo e punha nas faces oleosas duas rodelas de ruge brilhoso. Parecia um bonecão de louça meio quebrado.”(p. 72). Durante a consulta, a cartomante comia um bombom atrás do outro compulsivamente. Trabalhara na zona e, sem poder ser diferente da realidade que conhecemos, sustentara um cafetão, a quem amava. Tornara-se cafetina quando começara a engordar e perder os dentes. O narrador coloca Madama Carlota como o ponto alto da existência de Macabéa, já que seria a informante do seu futuro, que mudaria (e realmente mudou) a partir do momento em que Maca saísse da casa da Madama
nO médico: procurado por Maca, quando, pela primeira vez na vida, fez a audácia de procurar um médico (barato) após o recebimento do salário. “Muito gordo e suado, tinha um tique nervoso que o fazia de quando em quando ritmadamente repuxar os lábios. O resultado era parecer que estava fazendo beicinho de bebê quando está prestes a chorar. (...) não tinha objetivo nenhum. A medicina era apenas para ganhar dinheiro e nunca por amor à profissão nem a doentes. Era desatento e achava a pobreza uma coisa feia. Trabalhava para os pobres detestando lidar com eles. Eles eram para ele o rebotalho de uma sociedade muito alta à qual também não pertencia. Sabia que estava desatualizado na medicina e nas novidades clínicas mas para pobre servia. O seu sonho era ter dinheiro para fazer exatamente o que queria: nada.” (ps.67, 68)
nO rico ocupante do Mercedez Benz: dono do carrão amarelo, alourado e estrangeiro, é quem vai realizar, de certa forma, as previsões de Madama Carlota.
nO narrador: também uma personagem, Rodrigo S. M., a questão do narrador será melhor discutida logo a seguir.
nO médico: procurado por Maca, quando, pela primeira vez na vida, fez a audácia de procurar um médico (barato) após o recebimento do salário. “Muito gordo e suado, tinha um tique nervoso que o fazia de quando em quando ritmadamente repuxar os lábios. O resultado era parecer que estava fazendo beicinho de bebê quando está prestes a chorar. (...) não tinha objetivo nenhum. A medicina era apenas para ganhar dinheiro e nunca por amor à profissão nem a doentes. Era desatento e achava a pobreza uma coisa feia. Trabalhava para os pobres detestando lidar com eles. Eles eram para ele o rebotalho de uma sociedade muito alta à qual também não pertencia. Sabia que estava desatualizado na medicina e nas novidades clínicas mas para pobre servia. O seu sonho era ter dinheiro para fazer exatamente o que queria: nada.” (ps.67, 68)
nO rico ocupante do Mercedez Benz: dono do carrão amarelo, alourado e estrangeiro, é quem vai realizar, de certa forma, as previsões de Madama Carlota.
nO narrador: também uma personagem, Rodrigo S. M., a questão do narrador será melhor discutida logo a seguir.
nO médico: procurado por Maca, quando, pela primeira vez na vida, fez a audácia de procurar um médico (barato) após o recebimento do salário. “Muito gordo e suado, tinha um tique nervoso que o fazia de quando em quando ritmadamente repuxar os lábios. O resultado era parecer que estava fazendo beicinho de bebê quando está prestes a chorar. (...) não tinha objetivo nenhum. A medicina era apenas para ganhar dinheiro e nunca por amor à profissão nem a doentes. Era desatento e achava a pobreza uma coisa feia. Trabalhava para os pobres detestando lidar com eles. Eles eram para ele o rebotalho de uma sociedade muito alta à qual também não pertencia. Sabia que estava desatualizado na medicina e nas novidades clínicas mas para pobre servia. O seu sonho era ter dinheiro para fazer exatamente o que queria: nada.” (ps.67, 68)
nO rico ocupante do Mercedez Benz: dono do carrão amarelo, alourado e estrangeiro, é quem vai realizar, de certa forma, as previsões de Madama Carlota.
nO narrador: também uma personagem, Rodrigo S. M.,
 
 
 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário